Saudação de Paz (São José Marello - Cartas Pastorais)

SAUDAÇÃO DE PAZ
1889

J O S É    M A R E L L O

Bispo de Acqui


Aos Veneráveis Irmãos e Filhos em Cristo diletíssimos Dignidades, Cônegos, Párocos, Clero, Optimates, Magistrados e Povo da Cidade e Diocese.

PAZ E SAÚDE NO SENHOR


Pax vobis. A paz esteja convosco, ó Veneráveis Irmãos e Filhos diletíssimos. A primeira palavra que vos dirijo é uma saudação de paz, um augúrio de bem: saudação e augúrio que não compreenda somente aquela paz, aquele bem a que aspira o nosso coração por tendência natural, mas um bem incomparavelmente maior e de todo sobrenatural, a paz verdadeira que foi anunciada pelos coros angelicais aos homens de boa vontade quando vindo à terra de Jesus Cristo; que é um reflexo na vida presente daquele inefável estado de contentamento e de amor a que se chama glória na segunda vida., e como desce do céu, torna semelhante a terra ao céu tanto quanto possível. A Igreja está constituída pelo seu Fundador Divino como depositária e dispensadora deste tesouro, dado que por meio dela aprendem-se aquelas verdades, recebem-se aquelas graças, nas quais o coração e a mente encontram o seu repouso. Como ministro da Igreja que sou, embora indigno, e a vós mandado, pelo seu Chefe visível, ao dar-vos aquela saudação de paz, que haverei de renovar-vos do santo altar todos os dias, começo desde já a comunicá-la às vossas almas. É portanto uma missão de paz que venho cumprir entre vós, a mesma missão que por bem dezessete anos cumpriu o benemérito Pastor que tanto amastes, aquela de muitos personagens insignes por ciência e virtude que ilustraram a Sé episcopal Acqüense, aquela de S. Majorino e de São Guido a quem invocamos como nossos protetores no céu. Missão salutar para vós, mas para mim tremenda e portadora de graves solicitudes e também de penosa trepidação se o ânimo não se aquietasse na paz da obediência, se eu não soubesse que hei de encontrar na diocese muitos auxiliares prontos a favorecer o seu cumprimento.
E os primeiros auxiliares, o apoio mais válido para a minha missão sereis vós, ó Veneráveis Irmãos, Dignidades e Cônegos da Catedral. A Igreja mãe próvida, quer que eu me apoie no vosso saber e na vossa experiência ao exercer o ministério episcopal, e que vós em todas as ocorrências difíceis sejais generosos para comigo da vossa luz e conselho. Já desde hoje exponho-vos o meu eterno reconhecimento por todos os auxílios que confiante vos pedirei e que vós fraternalmente me prestareis, e agradeço ao Senhor por me circundar de um Senado distinto por doutrina e virtude, pelo grande amor que devota à Igreja de Cristo, pelo filial apego à Cátedra de Pedro.
Aos auxílios que eu espero do vosso conselho e obra, queirai ajuntar, ó Veneráveis Irmãos, o socorro potentíssimo da oração. Quando unidos na Casa do Senhor cantardes os seus louvores e invocardes sobre o povo as bênçãos celestes, lembrai-vos também de mim que devo ser guia para este povo, no caminho da salvação. O mesmo auxílio espero também de Vós, ó egrégios Cônegos, que na Igreja Colegiada de Campo Lígure também atendeis ao angélico ofício de louvar e glorificar a Deus.
Dirijo-me ainda a Vós, ó Venerandos Párocos, a vós que deveis espelhar comigo em meio ao povo a imagem do bom Pastor. Oh! quão doce é pensar que através de vós a minha missão será fecunda de bem nos cantos mais afastados da Diocese: que pelo nosso zelo poderei  cumprir melhor o ofício pastoral: conhecer as minhas ovelhas, assegurar-lhes salutares pastagens defendê-las do inimigo rapace, guiá-las ao eterno aprisco.
Mas com tantas almas a ,salvar, o nosso zelo não bastaria se conjunto a ele não estivesse o zelo daqueles Sacerdotes, os quais, não tendo embora o cuidado particular de uma grei, devem todavia pela graça da ordenação servir a Deus nos santos ministérios. Também vós, Sacerdotes caríssimos, sede a imagem do Bom Pastor, esforçai-vos também vós para evangelizar transmitindo sempre a paz. Olhai ao redor: quantos jovens com quem é necessário partir o pão da palavra de Deus! Quantos atribulados a quem uma boca inspirada pela caridade de Jesus Cristo pode comunicar o consolo! Quantos pecadores a quem Deus por meio do seu ministro quer restituir a paz da consciência! Haja entre vós, como entre os Párocos, uma santa emulação de zelo pela saúde das almas; e recebereis um dia do Príncipe dos Pastores a vossa coroa. de glória. Cum apparuerit Princeps Pastorum percipietis immarcescibilem gloriae coronam.
Uma palavra de afeto a vós dirijo, ó Sacerdotes do clero regular,  que perseverantes na vossa sublime vocação caminhais nas pegadas gloriosas dos heróis de santidade: Francisco de Assis, José Calasâncio Paulo da Cruz. Precioso é o bem que fazeis na Diocese; são agradáveis ao Senhor os vossos passos no ministério da pregação evangélica; frutuosas e benditas as nossas solicitudes e fadigas pela juventude. Poucos de números, vos multiplicais no vosso zelo, com aquele zelo que tem em vista somente a glória de Deus e a salvação das almas e que nos vossos santos Fundadores operou maravilhas; e a recompensa que não receberdes aqui na terra tê-la-eis ao lado deles, em profusão, no céu. Gaudete et exultate, quoniam merces vestra copiosa est in coelis.
E a vós, então, ó caríssimos Alunos do Santuário, quantas coisas tenho para dizer-vos que agora não me é concedido nem mesmo acenar! Por isso, sinto vivíssimo desejo de encontrar-me logo convosco; de falar-vos das esperanças que a Igreja depõe em vós; de solicitar-vos a crescer em ciência e virtude a fim de que aquelas esperanças não sejam desiludidas; de alegrar-me pela vossa correspondência aos dons e às graças que recebestes do Senhor para tornar-vos dignos do altíssimo ministério a que Ele vos chama. E se encherá de santa letícia o meu coração no dia em que eu puder impor-vos as mãos, e suscitar em vós novos evangelizadores de paz para o meu dileto povo.
Igualmente doce para mim é dirigir a palavra a vós, ó Virgens do Senhor, que em bom número servis ao Esposo celeste na, Diocese Acqüense. Também vós sois cooperadoras da minha missão, também o vosso é um ministério de paz. Esta paz, vós a invocais do céu no angélico ofício da oração; vós a difundis nas famílias educando as moçoilas àquelas virtudes que farão delas mães exemplares; e através de muitas de vós este dom de Deus é levado na morada da dor ao leito dos pobres doentes. Prossegui generosamente no caminho que iniciastes resolutas, e Jesus vosso Esposo divino vos encha o coração de paz e de gáudio. Pax Christi exultet in cordibus vestris, penhor daquela paz perfeita, daquele gáudio perene que vos está reservado no céu.
Também a vós, ó ilustres Personagens que na Diocese presidis à tutela do bem público, também a vós me seja permitido endereçar una saudação reverente e afetuosa. Vós representais aquela potestade ordenada por Deus e que é ministra d'Ele pelo bem (São Paulo aos Rom. XIII): ministra do bem, por isso ministra da paz que segundo a definição de Santo Agostinho é a tranqüilidade da ordem. Para promover juntos este bem, esta paz, nós nos permutaremos o auxílio oportuno; e um auxílio eficaz nós o invocaremos de Deus que é princípio de autoridade e que a valoriza ordenando a todos que lhe sejam submissos não só por temor mas por consciência, ameaçando de eterno castigo quem lhe opõe resistência. (S. Paulo, ib.)
Agora a cada um dos meus diletíssimos filhos gostaria, se fosse possível, de dirigir uma palavra de afeto, uma saudação de paz. Tende-a todos esta paz que meu amor vos deseja; nem o anjo maligno, seu antigo opositor, vô-lo possa fazer perdê-la jamais com a rebelhão à lei divina. Mantende-vos obedientes à Igreja que a mesma lei vos ensina a observar amorosamente, e com o coração inundado de paz vivereis naquela vida de caridade que é uma imagem, a melhor imagem da vida celeste que se possa formar no aquém.
Sendo a oração um dos atos principais desta vida de caridade, deixai, ó diletíssimos, que eu vos dirija um férvido convite a rezar. Sim, elevai a 0eus os vossos corações e orai. E primeiramente orai pelo Sumo Pontífice Leão Papa XIII. No dia em que ele preconizou o vosso Bispo saíram dos seus lábios, e mais que dos .lábios do paterno coração, belos votos de paz para a cristandade, aliás para todos os povos; já que os seus desejos e as suas fadigas apostólicas têm sempre em vista, a difusão do evangelho de paz por toda parte da terra. Orai ao Senhor para que se cumpram os votos deste Pai amantíssimo, e que ele veja florescer em meio aos seus filhos a justiça e a paz.
Orai pelo Eminentíssimo Cardeal da Santa Igreja Rafael Monaco La Valletta, Decano do Sacro Colégio e Penitenciário Maior, o qual se dignou sagrar-me como vosso Bispo e pelos dois ilustres Prelados Rocco Cocchia Arcebispo de Chieti e Inácio Pérsico Arcebispo de Damiata que assistiram à minha sagração.
Orai pelo Eminentíssimo Cardeal Gaetano Alimonda nosso venerado Metropolitano, que em momentos de trepidação para o meu coração abundou para mim em conselho e conforto.
A Igreja nos recomenda com as palavras do apóstolo que rezemos pro regibus et omnibus qui in sublimitate sunt, ut quietam et tranquillam vitam agamus (I Tm. II, 2). Orai então pelo nosso augusto Soberano, pela Família real, por todas as Autoridades; a fim de que Deus lhes conceda as luzes e as forças necessárias a quem preside ao bem público.
A caridade que vos une ao vosso Pastor já vos leia a rezar por ele; oh! queirai também elevar a Deus uma prece por aquelas pessoas queridas de cujo afeto a divina providência benignamente o circundava antes de enviá-lo entre vós; ajudai-o assim a pagar o tributo de gratidão para com aqueles dos quais se deve desapegar para ser todo vosso. Orai pelo anjo da 0ioce.se de Asti Dom José Ronco que foi para mim pai, e benfeitor amantíssimo; pelos Cônegos da Catedral que eu tive a ventura de poder chamar com o doce nome de irmãos; por todo o Clero de cuja preciosa benevolência pude sempre gozar, mesmo sem merecer; por  tantas outras pessoas diletas das quais conservo a lembrança esculpida no fundo do coração. Neste ofício de caridade vós tereis, tenho certeza, a retribuição, e a oração recíproca será para todos um meio de salvação. Oremus ad invicem, ut salvemur.
Agora concluo com a oração que deve sempre estar nos lábios do bom pastor pronto a sacrificar-se pelas amadas ovelhas: ó Senhor, ajuda-me a guardar em teu nome os filhos que me destes; dá que possa, quando me pedires conta de suas almas, responder-te com alegria: ei-los, todos os que guardei; nenhum deles se perdeu.
Com a confiança de que as orações recíprocas, reforçadas pela potente intercessão da Virgem Santíssima e dos nossos Santos Patronos, serão acolhidas pela bondade divina, e irão impetrar-nos toda graça desejada, dou-vos, ó Veneráveis Irmãos e Filhos Diletíssimos, a benção pastoral. Pax, et benedictio Dei Omnipotentis Patris, et Filii et Espiritus Sancti descendat super vos, et maneat semper. Amém.

Asti, 31 de maio de 1889

+ J O S É     Bispo

Sac. Pedro Peloso, Secretário